quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Uma tarde no Ipiranga

por Patrícia Ogando

Eis que o azul ganha o céu da capital paulista numa quinta-feira de inverno primaveril. O 7 de setembro já tinha passado, então o gracejo de São Pedro não foi por conta da efeméride de independência. Na paisagem, o pálido e imponente edifício de inspirações renascentistas novamente irrompe – agora, entre o verde dos jardins e o céu anil, o contraste é evidenciado. Localizado no bairro de mesmo nome é conhecido como Museu do Ipiranga, mas, a revelia dos costumes, é formalmente denominado Museu Paulista da Universidade de São Paulo.

Museu Paulista (foto: Helio Nobre)

Sua grandiosidade, expressa nas proporções, é coerente com a importância que tem para os habitantes da cidade. É um dos museus mais visitados da capital. São cerca de 400 mil visitas anuais e o público é bem variado: crianças, cinquentonas, jovens casais e cadeirantes (que ainda sofrem com a falta de elevadores para acesso ao primeiro piso). Com mais de um século de história, foi integrado a Universidade de São Paulo em 1963. Consagrando-se como instituição científica, cultural e educacional, tem como área de especialidade a História da Cultura Material. Trocando em miúdos, busca compreender e contar a história do Brasil por meio dos objetos. Afinal, como afirmou a própria diretora da instituição, Cecilia Helena Lorenzini de Salles Oliveira, a história acaba se revelando em objetos. “Num lugar em que predominam acervos tridimensionais, o que nos interessa (aos pesquisadores) não é propriamente a funcionalidade dos objetos, mas também suas formas”, conta a diretora. E as formas são realizações daqueles que fazem a história, nós, humanos.

As linhas de pesquisa do Museu são três: Cotidiano e Sociedade, História do Imaginário e Universo do Trabalho. Mas é emUniverso do Trabalho que está a novidade. Até 7 de novembro, realiza-se no museu a mostra “O Ofício do Alfaiate: a bancada de Roldão de Souza Filho”. Instalada em um pequeno corredor com cheiro de madeira (como em outros tantos ambientes do edifício), a exposição revela o autor das formas explícitas naqueles objetos expostos em paredes e vitrines bilaterais. Moldes, réguas de madeira, roupas etiquetadas com a inscrição “Roldão” e o número de telefone do alfaite – quando ainda eram apenas sete dígitos na cidade de São Paulo –, curiosas fotografias em preto e branco de um jovem Roldão que, mesmo na praia, vestia terno, integram a mostra. A coleção, muito bem conservada, foi doada integralmente pela família Souza Filho.

Essa mostra chega para completar as coleções da instituição que procuram construir a figura do artífice, a qual a diretora diferencia do artesão por este não exercer tanto o trabalho de criação. A figura do artífice aparece em outras coleções, como a do marceneiro, carpinteiro, sapateiro, entre outras. A diretora completa dizendo que essa exposição mostra que mesmo numa sociedade da cultura do descartável, ainda há espaço para pessoas que não são descartáveis.


Alfaiataria: custos e costumes na ordem do dia

Nos séculos XIX e meados do XX, a oferta de roupas prontas – o “prêt-à-porter” – era muito pequena, assim o preço de se encomendar uma vestimenta era bem menor do que nos dias de hoje, em que fazer isso é para poucos e, no geral, endinheirados. Antes da revolução que trouxe a produção em grande escala, a maioria das pessoas utilizava roupas feitas por costureiras, no caso das mulheres, e por alfaiates, no caso dos homens (embora não existisse um limite ortodoxo entre os gêneros). A mostra “O Ofício do Alfaiate”, segundo Adilson José de Almeida, supervisor técnico do Serviço de Objetos do Museu e membro do grupo de pesquisa Moda, Comunicação e Cultura, é importante justamente por apresentar um novo modo de contar a história da moda, que normalmente se restringe à alta-costura. Pelas roupas da maioria, a exposição revela parte de uma história que começou em meados do século passado na cidade de São Paulo, mas que acaba por nos lançar em séculos de uma profissão que hoje luta contra os leões da indústria para sobreviver.


SERVIÇO:

LOCAL: Museu Paulista da USP l Parque da Independência, s/n, Ipiranga

EXPOSIÇÃO: “O Ofício do Alfaiate: a bancada de Roldão de Souza Filho”

PERÍODO: 7 de agosto até 7 de novembro l terça a domingo l 9h às 17h

INFORMAÇÕES: (11) 2065-8000 l www.mp.usp.br

PREÇO: R$ 6,00 (inteira) e R$3,00 (meia-entrada) *Crianças até 6 anos e adultos maiores de 60 são isentos. / Todo primeiro domingo do mês entrada é franca.

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